23/10/2023
AGRO
Vida nova com cafés especiais e criação de abelhas sem ferrão

Após perder uma perna em acidente de trabalho, o agricultor Germano contou com a força da mulher

O único voo nupcial da vida da abelhaUruçu-capixaba não cansa de encantar o casal Germano Hilgert Filho (52) e Ivonete de Souza (40), de Santa Teresa, região serrana capixaba. O acasalamento da personagem central da colmeia representa mais que a reprodução e preservação da espécie no topo da linha de extinção para os agricultores da Serra dos Pregos, zona rural do município.

 

Há oito anos, a meliponicultura- criação racional de abelhas sem ferrão- somou-se à produção de cafés especiais e deu nova vida para Germano. Ao perder uma perna em acidente de trabalho em janeiro de 2012 e ficar hospitalizado por 62 dias, o agricultor entrou numa forte depressão. E as abelhas polinizaram seus pensamentos com boas perspectivas de negócios na propriedade.

 

“Eu tinha desistido de viver, pedia muito a Deus para me tirar deste mundo porque me considerava um lixo. Não conseguia me adaptar sem a perna. Passar por uma situação dessa é muito triste, mas com a criação de abelhas e o projeto de ampliar as lavouras de café veio a superação ”, conta o agricultor.

 

 

Hilgert buscava uma opção diferente de terapia ocupacional. Na casa da mãe, encontrou um tronco antigo de madeira e teve a ideia de fazer uma caixa de abelha. Pediu auxílio a apicultores experientes, mas acabou começando a atividade por iniciativa própria. Em um ano, conseguiu reproduzir 16 caixas de abelhas.

 

A partir da técnica própria de produção das caixas de abelha sem ferrão, a meliponicultura se tornou a atividade mais remunerada da propriedade. Em fevereiro deste ano, Germano e Ivonete multiplicaram as colônias, rendendo 400 caixas e renda impensável antes da atividade.

 

Atualmente, os sítios vizinhos, Pôr do Sol e Raio do Sol, concentram mais de 100 espécies de abelha sem ferrão. O casal não vende o mel, apenas enxames da espécie amarela, uma vez que a Uruçu-capixaba é apenas para preservação.

 

“Jamais imaginei que a meliponicultura se tornaria o carro-chefe da propriedade. Eu e minha esposa começamos a fazer a multiplicação das caixas e minha mente passou a ficar ocupada. Hoje, a renda com as abelhas ajuda a adquirir os implementos agrícolas e contratar trabalhadores para a colheita do café no caso de sufoco no serviço, porque aqui ainda predomina o trabalho familiar ”, diz o agricultor se referindo a ele, a mulher e ao filho John Herman (19), um dos três da prole.

 

O sucesso foi tão grande com a criação de abelhas que inspirou a logomarca com o formato de um “sorriso ”, estampada em todas as caixas. “Porque depois da depressão veio o sorriso ”, justifica. E hoje, não à toa, as caixas do Germano são conhecidas como “Caixas Sorriso ”.

 

Uma esmeralda extraída da casca-preta

O casal Germano Hilgert Filho e Ivonete de Souza cria a abelha Uruçu-capixaba e outras do bioma natural dentro da reserva legal de 5,5 hectares da propriedade. A espécie sem ferrão e ameaçada de extinção, só encontrada no Espírito Santo, produz o exótico mel verde, uma esmeralda líquida aos olhos dos turistas.

 

O mel é extraído da flor da árvore nativa conhecida como casca-preta, também chamada de “Swartbork ” pelos pomeranos. A árvore predomina em regiões mais frias como Santa Teresa, Santa Maria de Jetibá e Domingos Martins. Devido seu verde intenso, se assemelha a uma esmeralda quando está nos copos de mel.

 

Além da predileção das abelhas Uruçu-capixaba pela flor da casca-preta, que dá o ano todo, a ideia dos agricultores foi utilizá-la como cobertura morta nas áreas de café onde o solo fica descoberto no meio da rua. O casal semeia a flor para produzir mais, manejando com roçadeira até fazer a cobertura completa do solo.

 

Quando o cafezal está aflorando, não se aplica nada na lavoura que possa prejudicar as abelhas. “É uma novidade para vermos até onde podemos chegar. Experiência nova para unir abelha e café ”, destaca o coordenador de nutrição de planta da Coopeavi, Eli Carlos Betzel, cooperativa a qual Ivonete é associada.

 

Segundo a produtora rural, a princesa da espécie Uruçu-capixaba sai da caixa uma única vez para se acasalar no ar com vários zangões durante o voo nupcial. “Uma vez que ela faz esse voo é pra vida toda. Aí ela entra na caixa e o zangão morre. Daí ela vive por mais três anos, enquanto seu exército de campeiras duram em torno de quarenta e cinco dias ”, explica Ivonete.

 

A reprodução das abelhas sem ferrão com o uso de caixas ajuda a conservar as espécies. De acordo com a agricultora, com a multiplicação racional, não é necessário ir à natureza retirar o enxame das árvores. “A partir do momento que se cria abelha se começa a preservar. É impossível você criar abelha sem preservação. Quando se decide ser um criador de abelha, vai estar preservando e conservando as espécies ”.

 

Ivonete ressalta ainda o trabalho apenas com abelhas do bioma natural, em cumprimento à legislação em vigor. Segundo ela, o Espírito Santo conta com 50 espécies sem ferrão catalogadas, mas o cruzamento da Uruçu-capixaba com a abelha nordestina, importada, gerou um híbrido, ameaçando a Uruçu de extinção.

 

Propriedade é referência até para estrangeiros

A multiplicação dos enxames fica por conta de Ivonete e o filho John Herman. A dupla se dedica ao manejo, “que exige muito, pois é preciso frequentemente acompanhar se deu rainha ou se tem que colocar módulo ”, explica a agricultora.

 

A procura pelos enxames é grande. A família se tornou referência no mercado de meliponicultura capixaba por conta da qualidade do mel de abelhas sem ferrão.

 

Os sítios recebem constantemente estudantes de veterinária e apreciadores de várias partes do país e também da Alemanha, Argentina, Portugal e Itália que ouvem a história de superação do “Mestre Germano ” e podem experimentar o mel de canudinho diretamente da colmeia.

 

“Os visitantes ficam emocionados com a experiência. O jambo ou a jabuticaba polinizados por abelha sem ferrão conferem outro sabor ao mel ”, diz Ivonete.

 

O designer gráfico Fred Colnago(foto abaixo), de Santa Teresa, relata o que viveu no sítio.

 

“Uma das experiencias mais marcantes da minha vida: tomar mel de canudinho, direto da colmeia. Em cada colmeia o mel tem um sabor diferente. Sendo próximo do pé de jambo, sabor mais frutado. Próximo do café ou eucalipto, mais silvestre. É tipo experimentar vinho ”.

 

O mundo de sensações ao sabor dos visitantes é fruto também da dedicação dos Hilgert. Ivonete afirma que, antes de ingressar na meliponicultura, é importante os agricultores formarem um pasto apícola com plantas e árvores que deem flor o ano todo, a exemplo do eucalipto (com muito pólen e néctar), com florada entre fevereiro e maio, e do café, com três floradas entre setembro e novembro.

 

“Já foi comprovado que o cafezal aumenta em 30% a produção com a polinização das abelhas sem ferrão. Sem falar da importância das abelhas na natureza. Setenta e cinco por cento de todo alimento produzido no Brasil é polinizado por abelhas e insetos polinizadores. E oitenta e seis por cento de toda produção mundial depende das abelhas ”, diz Ivonete, sempre informada sobre a atividade.




Autor: Leandro Fidelis
Fonte: CONEXÃO SAFRA













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