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Águas subterrâneas: necessidade de avançar II

14 de setembro de 2016

 

No dia 02 de setembro, em São Mateus, foi realizado o 6º Encontro Estadual de Irrigantes que, entre outros, contou com uma verdadeira aula proferida pelo professor José Augusto Costa Gonçalves da Universidade Federal de Itajubá – MG. Neste caso específico o potencial uso das águas subterrâneas do Estado do Espírito Santo foi abordado de forma objetiva e com uma riqueza impar de dados.


As águas subterrâneas correspondem a 4% do total disponível no planeta. Pode parecer pouco, mas se consideramos somente a água doce disponível na forma líquida percebe-se que este índice vai para 97% e as águas superficiais responde pelos outros 3%. Em números absolutos tem-se 4.170.000 km³ de água subterrânea e 126.250 km³ de lagos e rios.


 

 

Sobre as funções dos aquíferos subterrâneos destacam-se: o fornecimento em quantidade e qualidade para usos diversos; estocagem e regularização, fundamental em períodos de secas como este que atravessamos; filtragem natural; uma importante função ambiental pois auxiliam na manutenção de ecossistemas e biodiversidade; e até energética onde, apesar de inexplorado no Brasil, há países que exploram as águas subterrâneas aquecidas como fonte de energia elétrica.


Ressaltando o exposto no artigo passado, ao analisar o custo de captação da água, sem levar em conta o transporte, nota-se mais uma vez a vantagem da água subterrânea. De acordo com a publicação de Águas Doces do Brasil, os custos de poços tubulares ficam entre US$ 80 a US$ 88 por mil m³ de água. Já para captação de rios (só armazenamento) o custo varia de US$ 123 a US$ 246 para o mesmo volume. Outras modalidades também apresentam valores mais elevados como osmose reversa que pode chegar a um máximo de US$ 397, eletrodiálise com US$ 537 e o reuso de esgoto doméstico com US$ 485.


Não é segredo para ninguém o imenso potencial hídrico do Brasil, onde, somente daqueles estudados, encontram-se 181 aquíferos sendo 151 de domínio sedimentar, ou seja, de exploração com condições mais favoráveis (aquífero poroso) do que aqueles de domínio rochoso (aquífero fissurado). Com os avanços e a diversificação dos estudos estes números fatalmente cresceram exponencialmente. Para se ter uma ideia a grande maioria dos estudos sobre aquíferos estão sobre o Guarani, o mais conhecido. No entanto há a descoberta de um aquífero sob os Estados do Pará, Amazônia e Amapá, o Alter do Chão, que apresenta volumes armazenados superiores.


Aqui no Estado a dificuldade de dados persiste. Pode-se realizar consultas em alguns mapas como o Mapa Hidrogeológico da Região Sudeste (IBGE 2016), Mapa de Favorabilidade de Águas Subterrâneas do ES (CPRMA 2010) e o Mapa Geológico do ES (IEMA), porém em todos os dados são bastante regionalizados. Ao consultar o mapa de aquíferos existentes e estudados no Brasil, percebemos a presença do Barreiras em nosso Estado( área dos solos de tabuleiros –aquifero poroso). Presente em maior parte na região norte central e litoral, o mesmo se afunila sempre em direção ao litoral capixaba até atingir a divisa com o Estado do Rio de Janeiro (mapa de Albino et al, 2001).


O aquífero Barreiras apresenta maior porosidade quando comparados a área do cristalino(área onde predomina rochas ). Esse último, os aquíferos estão localizados em fendas, fraturas ou fissuras das rochas de granito/gnaisse. Daí nota-se uma maior dificuldade em identificar os melhores locais para perfuração de poços tubulares nestas regiões.


Já na região de ocorrência do Barreiras as dificuldades são menores, no entanto o efeito que um poço causa em outro com proximidade reduzida é maior. Para tanto é fundamental manter uma distância de segurança. Mas que distância é esta? Alguns fatores interferem na sua definição como: o tipo de rocha que se tem no subsolo; da posição dos poços quanto a disposição na topografia da região; do tipo de aquífero existente na localidade; se os poços tem filtros e em que quantidades, etc. Nos Estados de Minas Gerais e São Paulo, os órgãos ambientais trabalham com uma distância de 200 metros como a distância segura para que um poço não cause interferência em outro.

 

E com relação a disponibilidade hídrica no aquífero Barreiras? Ao analisarmos os dados do trabalho do professor José Augusto nota-se que pode perfurar poços nesta região de forma mais tranquila do que em outras devido a sua disponibilidade hídrica. A seguir tem-se uma tabela com o resultado do monitoramento de 110 poços perfurados na região da Bacia Hidrográfica do Rio Itaúnas com o objetivo de análise dos dados:

 

 

Bacia Hidrográfica do Rio Itaúnas

 

Disponibilidade Hídrica Subterrânea

Reserva

Q média
(m³/h)

Q mínima
(m³/h)

Q máxima (m³/h)

Poços com Q = 0 (zero)

 

Aquífero poroso (41 poços)

 

7,24

 

2,10

 

28,70

 

0

 

Aquífero fissurado (69 poços)

 

3,16

 

0,80

 

16,20

 

5

 

Pelos dados coletados nota-se vazões consideráveis para usos múltiplos da água com destaque para o baixo numero de poços que não apresentaram vazões na parte fissurada na Bacia. Com isso constata-se a viabilidade de exploração na mesma.


Para corroborar com os dados da Bacia do Itaúnas, segue a tabela do Rio São Mateus e do Rio Doce:

 

 

Bacia Hidrográfica do Rio São Mateus

 

Disponibilidade Hídrica Subterrânea

Reserva

Q média
(m³/h)

Q mínima
(m³/h)

Q máxima (m³/h)

Poços com Q = 0 (zero)

 

Aquífero poroso (37 poços)

 

13,48

 

1,80

 

31,70

 

0

 

Aquífero fissurado (48 poços)

 

4,27

 

1,00

 

15,50

 

3

 

 

Bacia Hidrográfica do Rio Doce

 

Disponibilidade Hídrica Subterrânea

Reserva

Q média
(m³/h)

Q mínima
(m³/h)

Q máxima (m³/h)

Poços com Q = 0 (zero)

 

Aquífero poroso (232 poços)

 

42,84

 

1,80

 

220,00

 

0

 

Aquífero fissurado (32 poços)

 

4,77

 

0,50

 

25,50

 

1

 

Os dados destas duas bacias ratificam o grande potencial de exploração das águas subterrânea na região norte do Estado. Mais uma vez o destaque vai para o baixo número de poços com vazões zeradas e também, na Bacia do Doce onde foram verificadas vazões de até 220 m³/h. Os dados completos de todas as bacias estão disponíveis no site do CEDAGRO.


Para avançar da gestão dos recursos hídricos é fundamental que estudos como este sejam amplamente divulgados e retomados de tempos em tempos. O complexo hidrológico é extremamente dinâmico e por isso requer uma gestão também dinâmica. Já passou da hora de utilizarmos a fonte subterrânea, de forma responsável, em conjunto com a superficial para o equilíbrio de todo o sistema e minimização dos impactos da crise.

 

 

Murilo Pedroni

Eng. Agrônomo, Assessor da Faes e Diretor Executivo do Cedagro
   
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